Vivemos num mundo de receios. Expressões como "mas", "talvez", "logo se vê", fazem demasiadas vezes parte do nosso vocabulário quotidiano.
Começamos por ter medo de nós. De quem somos. Medo do corpo que mostramos (que pode não agradar a quem o vê), das palavras que dizemos (que podem magoar o outro), das decisões que tomamos (porque podem não ser as correctas), dos rumos que seguimos (porque podem não nos levar a lugar algum).
Medo de nos olharmos ao espelho porque estamos com uns kg's a mais, de nos pronunciármos sobre um tema porque talvez não saibamos o suficiente sobre ele, de dizermos "não" a algo porque achamos que podemos estar a ser incorrectos, mesmo sabendo que "sim" não é de todo aquilo que queremos dizer.
Medo dos outros. De serem tão melhores que nós que nos sintamos demasiado pequenos; de serem mais bonitos e, por isso, ninguém irá reparar em nós quando estivermos com eles; de serem cruéis e poderem magoar-nos; de serem tão diferentes de nós que a interacção não seja possível; de não conseguirmos comunicar com eles; de chegármos à conclusão que são o que queríamos ser e não temos coragem.
Medo das ruas. Das ruas escuras e dos becos calados, dos assaltos que nelas podem acontecer, do coração batendo mais forte enquanto passamos por elas em passo acelarado.
Medo do futuro, porque não sabemos como vai ser (e não é suposto que seja assim?), pelo que procuramos quem nos tente dar umas "dicas" sobre ele, ou então.... agarramo-nos ao presente de uma forma de tal maneira mecânica e rígida que nos permite traçar uma linha sempre recta até esse futuro, onde não possam existir falsos trajectos, desvios ou curvas e onde tudo está pensado ao milímetro.
Medo do passado, de como este condiciona quem somos hoje, de como não podemos mudá-lo, de como já passou há tanto tempo que este parece andar a fugir-nos, escorregando-nos entre os dedos.
Sim, pavor do tempo. Do tempo que passa rápido de mais, daquele que tarda demais em passar, daquele que nunca mais chega, do que está quase a chegar.
Da morte, como o nosso último momento cá. Como o último momento de quem queremos bem, cá. Como o fim de algo que, afinal, não aproveitámos como deveríamos, porque tínhamos medo.
De dançar desgarrada de preconceitos e estereótipos, à nossa maneira, de olhos fechados, como se fossemos a única pessoa naquela sala ou, ainda melhor, como se a sala estivesse cheia de gente e nós, simplesmente, não quiséssemos saber.
De viajar. Perceber que afinal não estamos sozinhos na Terra. Existem mais línguas, mais culturas, mais formas de ver o mundo, e se calhar a nossa não é a melhor... ou precisa de complementos.
De dar sem limites, sem perguntar porquê, quando ou onde... sem esperar receber nada em troca. Pânico! Quem somos nós, dando tudo o que somos? Medo de confiar e de amar.
Medo de arriscar, porque temos medo de tudo aquilo de que falei anteriormente e muito mais.
Ainda que não imagine uma vida sem algum medo, porque acho que está intrínseco a nós, anseio que a consiga viver com determinação, vontade e energia para a aproveitar ao máximo. Chegar ao fim da mesma pensando que foi longa a caminhada mas que foi intensa. Que com curvas e contra-curvas, fui traçando o meu caminho à minha maneira e fui crescendo sempre um pouco mais. Que no final, quando alguém perguntar a quem me conheceu quem eu era, a resposta não seja um conjunto de adjectivos enumerados de forma fria, quase calculada ao pormenor, já característicos desses momentos, mas aquele brilho no olhar das histórias para contar... histórias de aventuras, conquistas e derrotas, sorrisos e lágrimas, boas e más decisões. Porque a vida tem tanto para nós que é impossível acertármos sempre... mas podemos conseguir aprender com a má pontaria.
E não... não temos de estar sempre felizes. A tristeza, a frustração, o mau humor e a vontade de acabar com certos momentos também nos fazem crescer. O que eu quero é conseguir, sempre, no meio de tudo isso, encontrar uma razão para dar a volta.
... como dizia uma pessoa em estadio terminal, com poucos meses de vida, quando se questionava sobre tudo isto:
"não estou a falar de morte, estou a falar de como é que quero viver a minha vida ..."
Inspirem-se a viver.