Curioso como algumas situações nos lembram outras, do passado, que pareciam guardadas num qualquer cofre fechado à chave.
Ontem, aquele momento de partilha, de despedida, de acompanhar até ao fim na partida de um mundo terreno.
E lembrei, aquele outro dia, em que como aluna entrei naquela casa. Não me recordo da sua cara, lembro apenas o vulto, na escuridão do quarto. Aquele ambiente pesado. A janela fechada era sinal de que aquele dia, era um mau dia. Num dia bom deixaria o sol entrar pela janela. Naquele dia não. A dor era demasiado intensa, assim como as náuseas. O cancro que lhe carcomia o corpo não lhe permitia abrir os olhos ao sol. Recordo que estive lá, falámos um pouco, referiu que teria de ir ao hospital porque o desconforto ultrapassava o limite que conseguia aguentar. O seu marido, vagueava pela casa, em silêncio, preparando tudo. Olhava-a, sentindo-me a cada segundo mais cheia de dor, de incapacidade para enfrentar a situação. Escutava-a, nos momentos de palavras arrastadas e trémulas, e nos momentos de silêncios prolongados pela pontada penetrante que a impedia, até, de respirar. Pus-lhe a minha mão nas costas, assegurando-lhe que continuava ali consigo.
Saímos, eu e ela, a minha "enfermeira orientadora", que me disse apenas "estiveste muito bem, e aquele toque, aquele toque foi tudo o que a senhora precisava".
Não consegui conter-me mais. E eu chorei.
1 comment:
querida isabel, muito obrigada pelos comentários! Não arranja aqui um espaçinho para divulgar a sua amiga?!
Você escreve bem que se farta! Tenho que lhe arranjar uns trabalhos!
;) brincadeirinha
Beijo bom
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