Monday, March 7, 2011

O sr. J. P.

Ouvi os seus gemidos e aproximei-me. Uma vez mais contorcia-se na cama com dor. O suor escorria-lhe pela face. Não conseguia falar. Mais um espasmo e uma dor insuportável para si. Dei-lhe a mão. Dei-lhe também a medicação analgésica disponível. A dor física passou mas olho para si e mantém-se outra dor, a que não consigo diminuir com comprimidos ou injecções. Mantém-se a dor de alma. Então olha-me nos olhos, engole em seco, contém algo que ia dizer. Dou-lhe o espaço para falar... aquele espaço, em silêncio, de quem aguarda o que estiver disposto a partilhar. E então diz: "não me importo de sofrer, de ir para casa e sofrer o que estou a sofrer aqui, só não quero morrer". Então olho-o, novamente, aperto-lhe a mão. Ele pergunta: "vou morrer?". Respondo que há coisas como a dor e a ansiedade, que podemos ajudar a controlar. Mas que outras coisas não conseguimos evitar. Chora novamente, um choro desesperado, contido mas raivoso ao mesmo tempo. "Porquê a mim?" Falamos sobre o que o preocupa... a resposta é curta: "só me preocupa morrer e deixar cá a minha família". Pai de duas filhas, de 15 e 2 anos, asseguro-lhe que o iremos também ajudar a despedir-se delas, e da sua esposa, e da sua mãe... As lágrimas não param... Eu quero, ao mesmo tempo, estar consigo e fugir dali. Permaneço. Até sentir que está capaz de me soltar a mão...

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